Alfabetização em queda

A queda de quase 19 pontos percentuais no índice de alfabetização dos alunos do 2º ano do Ensino Fundamental no Rio Grande do Sul, passando de 63,4% em 2023 para apenas 44,67% em 2024, segundo o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), é um sinal de alerta que deve ser tratado com máxima seriedade. Trata-se do futuro de milhares de crianças e da capacidade de o Estado garantir os direitos mais básicos da cidadania. Os impactos das enchentes de abril e maio de 2024, que provocaram o fechamento de escolas por até 77 dias em diversos municípios, são inegáveis. Mas é preciso reconhecer que a catástrofe climática expôs uma fragilidade anterior, estrutural, relacionada à gestão da educação. O problema vai além do evento climático. O que está em jogo é a nossa capacidade de planejar, agir com rapidez e gerenciar crises com eficiência.
A administração moderna exige planejamento estratégico, capacidade de adaptação e avaliação constante de desempenho. As metas estabelecidas para a alfabetização no Rio Grande do Sul eram ambiciosas, 66,2% em 2024 e 68,8% em 2025. O programa Alfabetiza Tchê, por exemplo, foi criado com cinco eixos de atuação e recebeu mais de R$ 40 milhões, incluindo distribuição de livros, capacitação de professores e premiações por desempenho. Ainda assim, os resultados não apareceram. A falha não está apenas na execução, mas na ausência de uma governança mais ágil, que seja capaz de fazer correções de rota em tempo real e assegurar que os investimentos se traduzem em impacto concreto na aprendizagem.
O Rio Grande do Sul sempre se orgulhou de seus indicadores educacionais, mas o dado mais recente o coloca na maior queda de pontos percentuais do país. Isso exige uma resposta institucional à altura. É preciso reconhecer que estratégias eficientes de gestão são indispensáveis na administração pública. Sem planejamento baseado em dados, sem acompanhamento contínuo e sem metas claras, não é possível obter resultados sustentáveis, sobretudo em áreas tão complexas quanto a educação básica. A alfabetização é a base de todo o desenvolvimento escolar e profissional. Uma criança que não lê e escreve no tempo certo tem sua trajetória comprometida em todas as áreas do conhecimento e, mais adiante, em sua inserção produtiva na sociedade.
Nesse cenário, é impossível ignorar a situação dos professores. Além de enfrentarem salas de aula muitas vezes superlotadas e estruturas físicas defasadas, os profissionais da educação lidam com baixa remuneração e, em alguns casos, com uma política de ganho variável atrelada à performance: uma estratégia que, sem as devidas condições de trabalho, acaba sendo mais uma pressão do que um incentivo. Muitos educadores precisam complementar sua formação por conta própria, arcando com custos para participar de cursos, seminários e atualizações. Para alcançar os resultados que a sociedade espera, é fundamental garantir não apenas valorização salarial, mas também oportunidades reais de desenvolvimento profissional. Nesse sentido, a formação continuada deve incluir, além de conteúdo pedagógico, capacitações voltadas à gestão escolar e de sala de aula. Um professor que entende de planejamento, metas e indicadores, por exemplo, é um agente ainda mais qualificado para transformar o ambiente educacional.
O setor público precisa incorporar definitivamente a cultura da avaliação e da responsabilização. O uso de dados do Saeb, do Saers e de outras fontes deve ser constante e sistemático. As decisões não podem ser baseadas apenas na intuição, mas em evidências concretas de onde estão os gargalos e o que precisa ser ajustado. Além disso, é fundamental que haja um ambiente colaborativo entre União, Estado e municípios, com objetivos compartilhados, metas pactuadas e acompanhamento rigoroso. A alfabetização de crianças de 6 e 7 anos não pode depender exclusivamente da sala de aula. É preciso envolver as famílias, a sociedade civil, o setor privado e todos os atores com capacidade de apoiar a transformação.
Enfrentar essa crise requer, acima de tudo, capacidade de gestão. A tragédia das enchentes precisa se tornar um ponto de virada, não uma justificativa para retrocessos. O Rio Grande do Sul precisa investir não só em infraestrutura, mas também em pessoas, processos e planejamento. É preciso formar professores, acompanhar o desempenho das escolas, estabelecer metas claras e cobrar resultados. Essa é a base de qualquer política pública que aspire a ser transformadora.
Alfabetizar bem é mais do que ensinar a ler. É garantir dignidade, cidadania e desenvolvimento. E isso só se faz com gestão eficiente, integrada e comprometida com o futuro. O futuro está batendo à porta!
Adm. Jorge Avancini
Foto da Capa: Arquivo / Agência Brasil