O real problema do sistema trabalhista

Nos últimos anos, o termo pejotização ganhou espaço nos debates sobre mercado de trabalho e relações profissionais no Brasil. Trata-se do movimento em que profissionais deixam de atuar sob o regime da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) para prestar serviços como pessoa jurídica. O tema desperta paixões, divide opiniões e, frequentemente, é tratado apenas pela superficialidade de seus impactos sobre os trabalhadores e sobre a proteção social.
Mas a pejotização não é uma disputa entre capital e trabalho, como alguns sugerem. Ela é, antes de tudo, uma tentativa de o trabalhador preservar uma renda maior diante de um sistema que pune a formalidade. O excesso de tributos e encargos retira valor da relação trabalhista: o empregado vê parte significativa de sua remuneração se perder em descontos obrigatórios, enquanto o empregador paga caro para manter um vínculo formal. É um jogo de perde-perde.
Para o trabalhador, os descontos compulsórios, como INSS (de 7,5% a 14%) e Imposto de Renda (até 27,5%), podem comprometer de 15% a 30% do salário bruto, dependendo da faixa de renda. Isso significa que, muitas vezes, o contracheque não reflete o esforço do dia a dia, corroendo o poder de compra e limitando o consumo das famílias. Pior: a sensação que permanece é a de pagar muito e receber pouco em troca, seja em serviços públicos, seja em garantias de aposentadoria.
Já para as empresas, a carga sobre a folha pode ultrapassar 40% do valor pago em salários, segundo a CNI. Isso desestimula contratações e afeta a competitividade, especialmente frente a concorrentes internacionais. O resultado é um mercado que reage buscando alternativas, da pejotização até a sonegação, porque o excesso de imposto distorce qualquer setor.
O Estado, em vez de simplificar, contribui para o problema. A recente reforma tributária prometia justiça e simplicidade, mas multiplicou isenções e regimes especiais. Se todos pagassem, a alíquota efetiva ficaria abaixo de 24%. Com privilégios e exceções, a carga supera 28%, tornando o sistema brasileiro um dos mais caros do mundo, sem entregar serviços compatíveis.
No fim, quem paga a conta é o trabalhador. Ele se vê obrigado a optar por um modelo de pejotização que amplia a renda imediata, mas que não garante, por exemplo, aposentadoria ou seguridade social no futuro. É aqui que o debate precisa evoluir: não basta criticar a pejotização, é preciso criar regras claras, modernas e justas para que o trabalhador PJ possa contribuir de forma adequada, garantindo uma rede de proteção social e previdenciária.
Ignorar essa realidade é insistir em combater apenas os sintomas, sem tratar a doença. A pejotização não é vilã, mas tampouco é a solução definitiva. Se o Brasil deseja construir um mercado mais justo, moderno e competitivo, é preciso aliviar a carga tributária, racionalizar a máquina pública e, sobretudo, proteger o trabalhador, seja ele CLT, seja ele PJ.
A pejotização é apenas o reflexo de um sistema que precisa mudar.
Adm. Jorge Avancini
Foto da capa: Fábio Rodrigues Pozzebom / Agência Brasil