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Sindicato dos Administradores no Estado do Rio Grande do Sul

Quando a energia falha, a economia para

Quando a energia falha, a economia para - O SINDAERGS – Sindicato dos Administradores no Estado do Rio Grande Sul, representa os Administradores gaúchos.

As recentes enchentes que atingiram Porto Alegre escancararam uma realidade incômoda: estamos completamente dependentes da tecnologia e, principalmente, da energia elétrica que a sustenta. A maior catástrofe climática da história da capital gaúcha deixou vários bairros sem luz por dias. O impacto foi profundo: com a falta de energia, o abastecimento de água foi interrompido, hospitais enfrentaram dificuldades para manter atendimentos, comércios e indústrias pararam, e sistemas de transporte, comunicação e serviços básicos ficaram comprometidos. Em uma cidade acostumada a funcionar em ritmo digital, a ausência de eletricidade significou a paralisação quase total da rotina e da economia local.

O que mais impressiona é a reação das pessoas diante da ausência desses serviços. Hoje, basta alguns minutos sem sinal de internet ou um corte momentâneo de energia para que muitos entrem em pânico. As pessoas ficam sem paciência, nervosas, desorientadas. Em questão de instantes, parece que perdemos nossa capacidade de operar sem o apoio da tecnologia. Situações que, décadas atrás, seriam enfrentadas com naturalidade — como a falta de luz — hoje provocam quase um colapso coletivo. Ontem mesmo, no prédio do sindicato, presenciei uma situação simbólica: um problema momentâneo de conexão de internet paralisou completamente o ambiente. Ninguém sabia o que fazer. Tudo parou.

Mas essa dependência extrema se agrava ainda mais quando olhamos para a fragilidade da nossa infraestrutura. Em maio do ano passado e agora novamente neste inverno, Porto Alegre sofreu com longos apagões em função de quedas de energia causadas, em grande parte, por galhos de árvores que rompem a fiação. Somos uma das cidades mais arborizadas do país — o que é uma virtude —, mas essa característica exige cuidado e manutenção. Infelizmente, a poda de árvores tem sido negligenciada há anos. Com ventos fortes ou chuvas intensas, a combinação de galhos altos e fiação exposta leva à interrupção dos serviços básicos. Não é difícil concluir que parte desse problema poderia ser evitado se nossa rede elétrica fosse subterrânea. Além de mais segura e eficiente, a fiação enterrada contribuiria para a beleza urbana e para a redução de acidentes e interrupções.

Ao mesmo tempo em que estamos cada vez mais conectados e tecnologicamente sofisticados, falhamos no básico: manutenção de infraestruturas, investimento em prevenção e planejamento urbano. As comportas, diques e casas de bombas que deveriam proteger Porto Alegre não receberam a devida atenção ao longo dos anos. Com a falência desse sistema, a cidade ficou exposta e vulnerável. O resultado é que milhares de pessoas e empresas foram forçadas a lidar com o caos, sem qualquer respaldo imediato.

Se queremos garantir um futuro produtivo, seguro e sustentável, é preciso rever com urgência a forma como organizamos nossas estruturas energéticas e tecnológicas. Devemos investir em redes elétricas inteligentes, descentralizadas e mais resilientes. Microgerações de energia, como a solar e a eólica, precisam deixar de ser promessa e passar a ser realidade em maior escala, sobretudo para garantir o funcionamento mínimo de serviços essenciais. Além disso, precisamos enfrentar nossa crescente dependência de tecnologias estrangeiras. Um estudo recente da USP e da UnB apontou que o Estado brasileiro gastou cerca de R$ 10 bilhões no último ano com tecnologias proprietárias, muitas vezes sem autonomia ou controle sobre os sistemas adotados. Isso é preocupante — pois não apenas nos tornamos reféns da energia, mas também das grandes corporações que controlam o acesso ao digital.

A maior lição que as enchentes e os apagões nos deixaram é clara: tecnologia sem resiliência é ilusão. A verdadeira inovação não pode estar dissociada da capacidade de resistir a falhas e reagir rapidamente a imprevistos. E isso exige políticas públicas consistentes, investimento em infraestrutura e, acima de tudo, uma mudança de mentalidade. Precisamos buscar o equilíbrio entre a eficiência da era digital e a solidez das práticas analógicas — aquelas que, mesmo sem wifi ou tomada, sempre deram conta do recado.

Adm. Jorge Avancini
Foto da Capa: Gerada por IA